onvidamos o Professor e Doutor, João Ricardo Tognini, para elencar os principais temas que estão sendo cobrados nas provas de Residência Médica no que diz respeito à Cirurgia Geral. O abdome agudo inflamatório e o trauma são apostados como os temas que merecem a sua atenção nessa jornada de estudos rumo à aprovação.O vídeo completo com o Professor pode ser conferido no no nosso IGTV.
1. Abdome Agudo Inflamatório
O primeiro tema, que o Dr. João Tognini considerado obrigatório para as provas de Residência Médica, é o abdome agudo inflamatório, que engloba a apendicite aguda, colecistite aguda, pancreatite e diverticulite.
Diverticulite
De acordo com o Dr. João Tognini, a diverticulite e os critérios de Hinchey têm aparecido bastante nas questões de prova de Residência Médica e do Revalida. A primeira dica que o professor João dá é em relação aos sintomas:
“A diverticulite provoca uma dor, normalmente, na fossa ilíaca esquerda, pode ter febre ou pode não ter, e nós temos os critérios de Hinchey, que são delimitados pelo exame padrão ouro, que é a tomografia”, relembra o Dr. João.
O professor resume cada um dos quatro estágios:
Hinchey 1: processo inflamatório apenas na parede intestinal. Pode ter até um pequeno abcesso, mas ele é só na parede intestinal. Se o médico tem esse dado na tomografia computadorizada, que é o exame de eleição, basta fazer o tratamento clínico com antibióticos e antiespasmódicos. Neste caso não é necessário operar.
Hinchey 2: abscesso restrito na pelve. Neste contexto tem-se uma sensação palpatória de rigidez, chamada de plastrão inflamatório. O preconizado pela literatura é uma punção guiada por ultrassom ou por tomografia, mapeia-se o local do abscesso e faz a punção.
Hinchey 3: peritonite difusa. Como a peritonite é purulenta apenas, a conduta é laparotomia ou laparoscopia com ressecção do sigmóide anastomose primária.
Hinchey 4: peritonite fecal. Neste nível é preciso distinguir se a peritonite é fecal ou se ela é só purulenta, mas os dois são cirúrgicos e só é possível confirmar através da laparotomia ou na laparoscopia. “Mas para o Hinchey 4, precisamos fazer a cirurgia, que é com colostomia proximal e sigmoidectomia (cirurgia de Hartmann).
Pancreatite Aguda
De acordo com o prof. João, algumas questões de concursos de Residência Médica apresentam algumas “pegadinhas”. Pensando nisso, ele deixa três grandes dicas sobre a pancreatite aguda:
1. Tomografia não é exame diagnóstico
É importante fazer tomografia em casos de pancreatite aguda, mas ela não é o exame diagnóstico, e sim um exame de mapeamento, de observação da gravidade - lembrar dos critérios de Baltazar - e ela deve ser feita nas primeiras 48 horas. Se o paciente chega no pronto-socorro com dor abdominal irradiada para as costas, vomitando, com história antiga de litíase biliar ou então alcoolismo, não deve-se pedir tomografia de imediato, mas sim as enzimas amilase e lipase.
2. A amilasemia não é específica
A elevação da amilase tem um pico inicial nas primeiras três horas, estendendo-se, habitualmente, a três dias. A lipase é muito mais específica e a duração do pico dela é de sete dias.
3. Se a amilasemia é persistente
Se a amilasemia não caiu em três dias, isso é sinal de provável pseudocisto de pâncreas.
Apendicite Aguda
De acordo com o professor João, existe uma discrepância entre a literatura e a prática, pois é muito comum o médico nem palpar o abdome, e pedir ultrassom e tomografia. Com o diagnóstico clínico, indica a operação. Porém, o Dr. João Tognini ressalta a importância dos critérios de alvarado, que leva em consideração alguns sinais clínicos, como a mobilização da dor, do epigástrico da fossa ilíaca, o hemograma com leucocitose, por exemplo.
“Se tiver dúvidas no diagnóstico diferencial, nós precisamos fazer exames complementares de acordo com cada situação. Por exemplo, uma mulher em idade fértil com um quadro pélvico, o diagnóstico diferencial vai requerer ultrassom vaginal, ou se for uma dor mais localizada, com uma massa abdominal, pode-se pedir uma tomografia. Então, fique atento aos enunciados das questões de cirurgia, como por exemplo as de cirurgia de trauma, elas costumam relacionar o conteúdo ao caso clínico para ver se o candidato sabe raciocinar, pensar, e as questões estão cada vez mais bem elaboradas. Não adianta simplesmente decorar”, conclui o Dr. João.
Abdome Perfurativo
Você já se perguntou qual é o paciente clássico de prova com quadro de abdome perfurativo? Pois bem, o abdome perfurativo leva a peritonite. Nós levamos em consideração a úlcera perfurada, que é o principal deles, lembrando que acontece mais em pacientes jovens, geralmente do sexo masculino e, principalmente, no período noturno.
Paciente magro, fumante, que teve uma dor lancinante e tem uma irritação peritoneal muito grande. Sabemos que o que irrita o peritônio na úlcera perfurada é a acidez do suco gástrico, diferente do abdome hemorrágico, em que o ph do sangue é normal e demora para irritar o peritônio.
Existe também o abdome agudo perfurativo por perfuração colônica. O cólon tem muito gás, então os pneumoperitonios de perfuração colônica costumam ser muito grandes e a irritação peritonial é um pouco mais tardia, porque não é suco gástrico, é fezes, e geralmente esses pacientes entram com acometimento inflamatório, infeccioso, muito grande pela contaminação fecal.
O professor afirma que é preciso aprender a interpretar um pneumoperitônio no raio x.
“Lembre-se de uma coisa importante: a tomografia mostra pneumoperitônio, mas o raio x de abdome agudo é o Rx de tórax e o Rx de abdome em pé e deitado. Porque, a partir do tórax, nós vamos ver a cúpula diafragmática e o pneumoperitônio embaixo da cúpula, entre o fígado e o diafragma”, completa o Dr. João.
Trauma
O trauma abdominal é um dos traumas que mais aparecem nas questões de prova, segundo o Dr. João. O trauma abdominal não tem uma linha específica no atendimento primário. Em caso de trauma abdominal, com sinais de hipovolemia, o médico precisa saber a classificação do choque (classe 1, classe 2, classe 3, classe 4) e fazer as reposições adequadas:
Classe 1: não precisa obrigatoriamente de reposição.
Classe 2: tem diminuição da pressão de pulso, cristalóide 1000 ml aquecido.
Classe 3: sangue de tipo específico com prova cruzada, além do cristalóide.
Classe 4: grande hipotensão, grande aumento da frequência respiratória, letargia, paciente obnublado e paciente precisa de protocolo de reposição maciça.
A conduta terapêutica do choque hipovolêmico resume-se em interromper possíveis focos de sangramento visíveis e fazer a reposição volêmica. A necessidade de reposição varia de acordo com a gravidade do choque, apenas o choque hipovolêmico de classe III e IV demandam transfusão.
“Lembre-se do ácido tranexâmico, 1 grama, nas primeiras três horas, que é uma atualização do programa ATLS, e, se está instável hemodinamicamente, eu preciso saber onde está o sangue. Verifique se o sangue está no abdômen , no tórax ou na pelve. Para isso, faça o ultrassom fast, que é o ultrassom rápido. No trauma penetrante, é importante saber se esse trauma é por arma de fogo ou por arma branca. Lembre-se que trauma por arma de fogo no abdômen é igual a laparotomia, só tem uma exceção, que é um rodapé de livro, que é o ferimento tangencial do abdômen. O que é ferimento tangencial? Ele entrou e saiu, por exemplo, no flanco, mas o orifício de entrada tem que ser no máximo 10 centímetros do orifício de saída, esta também é questão de prova”, alerta o professor.
Em caso de ferimento por arma de fogo, a regra é operar, mas se o ferimento for de arma branca, depende. Paciente estável hemodinamicamente, ferido por arma branca, se for na parede abdominal anterior, pode-se fazer exploração digital, mas se for na parede lateral ou se for na parede posterior, deve-se fazer exame físico seriado e também observar com uma tomografia de triplo contraste oral para ver lesão duodenal, contraste venoso para ver flush arterial e lesões de vísceras parenquimatosas e contraste retal para ver lesão colônica, que pode ir para o retroperitônio, ferimentos de flanco e dorso e contraste oral para verificar lesões gástricas ou duodenais. Não cabe exploração digital em flanco e dorso por causa dos grupos musculares. No trauma com contuso em que o paciente está estável hemodinamicamente nós precisamos fazer uma tomografia.
“O trauma contuso, mesmo fazendo o ultrassom fast, se tem algum sangue na cavidade, mas ele está estável hemodinamicamente, às vezes esse paciente é candidato ao tratamento não operatório. Isso tem sido muito cobrado nas provas. Pacientes que não tem peritonite, não tem pneumoperitônio, não tem sinais de irritação peritoneal, sinais de lesão de víscera oca e só tem a lesão de víscera maciça, dependendo do grau, pode-se tratar clinicamente. Lesões principalmente de fígado e baço até grau 3, lesões de rim até grau 4, monitorizo o doente, se fizer hipotensão ou sinais de irritação peritoneal, obviamente vamos operar, agora, são passíveis de tratamento não operatório”.
Prof. João Ricardo Filgueiras Tognini - Cirurgia Geral
Mestre e Doutor em Técnica Cirúrgica e Cirurgia Experimental pela Universidade Federal de São Paulo (UNIFESP). Residência médica em Cirurgia Geral pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Graduado em Medicina pela Universidade Federal de Mato Grosso do Sul (UFMS). Professor Titular de Clínica Cirúrgica na UFMS. Titular do Colégio Brasileiro de Cirurgiões. Diretor de Núcleo ATLS.